Desenvolvimento:
André Piva
Editora:
Débora Luz
Diagramação e Arte:
Laura Moura
Repórteres:
Amanda Vasconcelos
Bruna Evelyn
Candy Ferraz
Débora Luz
Kenidy Santana
Laura Moura
Lucas Salatiel
Mavi Oliveira
Surama Marjouri
Thaynnara Kirlianne
Fotos:
Alysson Souza
Ana Moraes
Emanuel Tadeu
Joellen Alves
Leydson Jackson
Mayra Ferreira
Rondinelli de Paula
Domínio Público
Introdução
André Piva
Na diversa e criativa produção artístico-cultural do povo nordestino, belas e expressivas poéticas textuais e imagéticas formam uma rede simbólica sobre a forte, aguerrida e contestadora Região que contradiz preconceitos, estigmas e estereótipos seculares
Nas últimas décadas, mesmo que ainda perdurem enunciados de preconceitos, estigmas e estereótipos particularmente, principalmente na política do ódio e da ignorância extremo direitista das redes sociais, destaca-se a mudança da rede discursiva que enaltece o Nordeste em imagético-discursivos com trópico prazeroso para vivências turísticas mediante a atratividade de suas praias e riqueza cultural, qualidade de vida e pelo progresso e desenvolvimento econômico.
TEATRO
A Teatralidade Nordestina: Memória e Afeto
Reportagem:
Amanda Vasconcelos e Kenidy Santana
Toda a identidade social é expressa em diferentes aspectos culturais de um povo, como o sotaque, memórias, costumes, culinária, vivências e demais elementos de sua vida cotidiana, com destaque para as suas produções artísticas, como o teatro, uma atividade artística em constante evolução em diferentes períodos cronológicos no percurso do tempo da humanidade, cujas temáticas quase sempre desafiaram normas e convenções da sociedade de seu momento histórico, com o estímulo ao pensamento crítico, às emoções e à conexão entre o público e as questões apresentadas na dramaturgia da peça encenada.
Fotos - Joellen Alves
Os autores e diretores em muitas encenações exploram questões sociais, políticas e culturais de modo a promover a conscientização e a reflexão sobre temas como gênero, poder, identidade, preconceito, xenofobia, violência, entre outros questões de grande interesse, conteúdos historicamente vistos no teatro nordestino ao longo de gerações, por marcar suas temáticas regionais em tempos e espaços atrelados às ações de resistência e em enfrentamento ao poder, colonialismo e exploração do povo.
Por outro lado, o teatro nordestino alcança alta projeção principalmente por desenvolver tramas da cultura popular, tão presentes nas obras emblemáticas de Ariano Suassuna, com identidade, especificidade e enunciados discursos próprios e originais, aspectos presentes em outros nomes de relevância do teatro regional, inclusive contemporâneos, como Everaldo Vasconcelos, Marcélia Cartaxo, Thardelly Lima, Zezita Matos e tantos outros, a exemplo dos componentes da Companhia Boca de Cena, Grupo Teatral Piollin e Grupo Bigorna, entre os demais grupos com trabalhos altamente enaltecidos.
Fernando Teixeira, ator, dramaturgo e diretor, reconhecido como o nome vivo mais relevante do teatro nordestino fala desta sua arte em uma visão que também posiciona a região em relação à sua cultura histórica e identidade.
Fotos - Joellen Alves
“O teatro me ensinou que a grande pátria de um ator é o palco”
- Fernando Texeira
Nascido em Conceição, município do Vale do Piancó, sudoeste da Paraíba, Fernando Teixeira é vencedor de diversos prêmios: melhor ator no Festival Comunicurtas pela atuação em “O Hóspede”, de Anacã Agra e Ramon Porto Mota, além das dezenas de espetáculos encenados – entre eles o “Auto da Compadecida”, “Papa Rabo”, “Anayde, 15 anos depois” e “Fogo Morto”, além de ter atuado em quase 30 produções cinematográficas.
Fotos - Joellen Alves
Foto - Joellen Alves
Fernando conta que o teatro é uma parte fundamental da sua atividade artística desde a juventude, que tendo começado como um brinquedo de criança, permaneceu como uma ferramenta expressiva com a qual interage com o mundo.
“O teatro me ensinou que a grande pátria de um ator é o palco, aprendi a conviver com as pessoas independentes de seus lugares de origem, que quando estamos na atividade teatral procuramos nos respeitar em função do que somos como criadores, e sempre estamos em sintonia com o lugar que nos acolhe e, se estou no nordeste do Brasil, os aspectos culturais deste lugar é o que me alimenta.”
Fotos - Joellen Alves
Fotos - Joellen Alves
Em especial João Pessoa, que é definida pelo ator como um ponto de conexão: “A cidade de João Pessoa, carinhosamente apelidada de Jampa, localiza-se no centro do antigo supercontinente pré-histórico chamado de Pangea há cerca de 240 milhões de anos. Para verificar isso basta procurar pelo mapa de Pangea na internet. Toda aquela região central do antigo supercontinente é onde hoje se localiza a atual região nordestina do Brasil, por isso acho que ela tem a característica de conectar com a primeira alma do mundo.”
Fernando Texeira afirma que a cultura nordestina antes do Brasil ser Brasil tem a ver com a sua história como terra antiga de Abya Yala, nome com o qual os povos originários designam todo o continente e que significa terra fecunda, pois já havia cultura aqui. O Brasil começou a ser desenhado nesta região, por isso ele diz que todos os brasileiros são também nordestinos, também participam da energia deste DNA que tornou possível toda a nação brasileira.
Fotos - Joellen Alves
“O Nordeste é como um lugar que os seus habitantes, nascidos ou abduzidos, irão carregar por toda a vida, esta é uma terra cuja energia contamina as pessoas com uma pulsação de vida e resiliência, de contemplação e luta pela liberdade e pela beleza. É um lugar que favorece a criatividade, mas também não acho que seja algo para se tratar com o status de uma terra especial, pois todas as fronteiras se diluem e todos os recantos são igualmente importantes”, conta o diretor.
Fotos - Joellen Alves
Fotos - Joellen Alves
As imagens exibidas durante a matéria são da fotógrafa Gabriela Osoegawa durante a peça “O Testemunho do Cangaceiro”, escrita pelo dramaturgo Chico de Assis e encenada pelos alunos de Teatro da Universidade Federal da Paraíba durante a Semana Cênica de 2023. Conta uma história ambientada no sertão nordestino, mostrando um homem que tenta cumprir uma promessa feita a um falecido, descobrindo no caminho o bem e o mal dentro de si e dos outros.
Foto - Joellen Alves
MÚSICA
O despertar do Nordeste
Reportagem:
Bruna Evelyn e Laura Moura
Em parceria com
Ao se buscar projeções simbólicas da identidade nordestina com sentido de resistência e inconformismo, ou mesmo protesto, encontramos enunciados plurais no percurso do tempo em vários segmentos da sociedade, em especial, no campo das artes e culturas, áreas de maior visibilidade e interações pelas suas marcas de prosa e poesia que sempre instigam, emocionam e arrebatam. Nos círculos dos próprios agentes produtores nordestinos, lembramos do cinema, desde os filmes de Glauber Rocha ao mais recente Bacurau, os personagens fortes e originais, de fibra, ilustram a ideia, no teatro e literatura, entre tantos outros, como não citar o imortal Ariano Suassuna e João Cabral de Melo Neto, além dos demais de um grande rol de autores geniais.
Contudo, fiquemos com a música, de temática nordestina, certamente, sob o entendimento de que se trata de uma arte tão popular e efetiva ao traçar marcantes tessituras imagético-discursivas, uma linguagem muito eficaz no dinamismo da construção identitária no meio social, com muitas canções revestidas de aura de expressão simbólica genuína, com letras e ritmos envolventes, o vigor e determinação para de dizer que o Brasil do Norte se posiciona, rechaça preconceitos. Com a palavra Geraldo Vandré e Chico Buarque.
“Seguia como num sonho, e boiadeiro era um rei
Mas o mundo foi rodando nas patas do meu cavalo
E nos sonhos que fui sonhando, as visões se clareando
As visões se clareando, até que um dia acordei”
Disparada - Jair Rodrigues
A canção ‘Disparada’ de Jair Rodrigues retrata a vida sertaneja, desde o sofrimento até a sua força inabalável. Em toda a sua história, o povo nordestino é marcado pela resistência e luta, conhecidos como reinventores do seu próprio futuro. E com a música isso não é diferente. Como na composição, ela desperta numa mistura de notas que exaltam não só a cultura nordestina, mas a sua trajetória para construção de uma identidade única.
Com o triângulo, acordeão e a viola ao seu lado, Luiz Gonzaga, o rei do baião, popularizou o que seria conhecido como a música nordestina. Encantando de norte a sul com obras revolucionárias, ele inventou o “êxodo cultural”, levando sua arte para outras regiões com a esperança de que um dia recebesse o devido valor. Contra todas as expectativas, obteve sucesso. Entretanto, surgia uma nova tendência: a valorização musical do nordeste a partir da aprovação das regiões sul e sudeste, além da restrição dessa manifestação cultural. Mais uma vez, imperceptivelmente, essa arte era amarrada e controlada como marionete. Disparada também foi uma obra marcante como enunciação de protesto, em sua época, à ditadura militar implantada em 1964, como também às injustiças sociais, já que um de seus principais sentidos era a denúncia da crônica exploração no Brasil dos mais ricos, os mais alinhados aos militares, aos mais pobres, na verdade sempre tratados como gado, conforme alude a letra da canção do incomparável Vandré.
“O forró faz parte do cotidiano do nordestino. A vivência do forró vai além do ritmo. É um universo que envolve vários aspectos como culinária, dança, literatura, artes cênicas, entre outros. Desse modo, o forró está presente na vida do povo nordestino de uma forma muito expressiva. É um dos fatores mais importantes na expansão da nossa cultura. Os festejos promovem educação social e vai até o desenvolvimento econômico da região”, comenta Betinho Lucena, integrante do grupo de forró “Os Fulano”.
“Esta cova em que estás, com palmos medida. É a conta menor que tiraste em vida”
Enterro de um Lavrador - Chico Buarque
O gingado nordestino ressoa por todo o país, invadindo corações com ritmos vibrantes e letras ferozes. Como um espelho de seu povo, a música reflete as suas raízes, gritos e choros. Limitá-la é ferir toda uma nação e, logo em seguida, “recompensá-la” com sua cova medida. Ao quebrar essas visões distorcidas, são reveladas faces perdidas em reflexos sem fim. De fato, a música nordestina vive, mas, ouvindo além do é proposto, quais são esses lados esquecidos e como são definidos?
Para além de técnicas específicas, um gênero musical se relaciona à sua origem histórico-geográfica, influências culturais da região e, principalmente, seu povo. Frevo, maracatu, xaxado, coco, baião, forró e tantos outros estilos musicais são característicos da localidade, já perpetuados como tradicionais. Contudo, a melodia nordestina vai muito além do ritmo acelerado do frevo, dos batuques do maracatu ou instrumentais do coco, sua verdadeira essência consiste na diversidade, palavra-chave para definir a sua musicalidade.
MÚSICA
Vozes Marginalizadas
“Começando uma vida diferente
De que a gente até hoje tem vivido
Imagina o Brasil ser dividido
E o Nordeste ficar independente”
Nordeste Independente - Elba Ramalho
Para trilhar seu caminho de pluralidades musicais, o nordeste tem feito o que faz de melhor: se reinventado. Nesta nova versão independente, sua musicalidade transita desde os ritmos tradicionais até os contemporâneos e novos estilos que têm surgido. Apesar da pressão cultural e tradicional, gêneros como metal, rock, punk e muitos outros têm crescido cada vez mais, se unificando ao atual cenário musical num embolado de sons, letras e vozes. O nordeste rompe com preconceitos e grita por sua liberdade, agora entoando o seu ser.
Para as gêmeas do duo Bravia, Mayra e Mayara, a música nordestina é o reflexo da pluralidade regional e todas as possibilidades de se fazer arte. “Acontecem transformações culturais, cultura é algo em movimento e ao mesmo tempo é a tentativa de preservar a memória de um povo”, comenta o duo.
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Ao escolher um caminho musical divergente, o olhar crítico dos que o cercam se faz presente. Aqueles que não entendem veem desrespeito nas notas dissonantes que desafiam a tradição. Entretanto, não se trata de rejeitar raízes, mas sim de revelar os múltiplos nordestes existentes, numa forma de identidade. O estigma obscurece o brilho da individualidade, mas a pluralidade expande horizontes nunca antes imaginados.
literatura
literatura
Cada terra tem seu norte, cada gente tem sua sorte!
Reportagem:
Surama Marjouri e Lucas Salatiel
Em parceria com
Jornais como “O Besouro”, editados na Capital Federal, Rio de Janeiro, lá na segunda metade do século 19, retratavam o atraso do Nordeste, com narrativas depreciativas sobre a região, ao descrever a seca e suas consequências: atraso, miséria e dependência. Relatos que se tornaram uma constante, repetidos no correr de décadas.
Mais tarde, os textos da imprensa, também prolixos, passaram a incluir a migração dos nordestinos para Sudeste, nos quais as mãos calejadas dos sertanejos eram apontadas como os instrumentos edificadores das grandes cidades. Estabeleceu-se, assim, uma rede discursiva única e recorrente, vista historicamente como estratégia política para se ter mão de obra barata ou mesmo uma retórica sensacionalista sobre uma terra condenada ao subdesenvolvimento em virtude de seu povo dolente.
Mas, houve quem denunciasse a pobreza da região como um fator político, o aproveitamento das intempéries climáticas pelas oligarquias locais que criaram e fizeram perdurar por décadas a indústria da seca, em textos literários que narram histórias fictícias, porém representativas, da realidade social da região, desenvolvidos por célebres escritores, como:
O baiano Jorge Amado, o alagoano Graciliano Ramos e o paraibano José Américo de Almeida, cujas obras são reconhecidas como manifestos contrários ao sistema de concentração fundiária
que explora e exaure os trabalhadores.
Contudo, nas últimas três décadas o Nordeste se afirmou com sua riqueza ambiental e cultural, passou a ser visto, em função do turismo, como um paraíso tropical, imagem de enaltecimento que junto aos atrativos de interesse para os visitantes, como as praias, o artesanato, os monumentos históricos, a culinária, a música, a receptividade, também faz a identidade regional ser vista de forma mais nobre, como um povo aguerrido, resistente e criativo.
Novas projeções identitárias instigam produções literárias contemporâneas, escritores com temas sobre o Nordeste da atualidade, como é o caso do paraibano Ricardo Oliveira, mestre em comunicação, com trabalhos com marketing de conteúdo, que em seu primeiro livro desenvolve uma narrativa estilística com elementos distópicos, apocalíticos e da cultura Geek, além de também abordar clássicos de obras literárias de sucesso internacional.
Assim, o desafio do escritor é dar visibilidade a essa atmosfera já aclamada nestes nossos novos tempos, para uma obra de singularidade pessoense.
A história aborda a vida do arquiteto e protagonista João que tem seu condomínio invadido por um gás tóxico misterioso, sendo o único sobrevivente que teve que lidar com as mortes em massa. Ele revira o passado dos seus vizinhos, familiares e amigos de infância através de diversos momentos no percurso do tempo.
Ricardo Oliveria nos falou sobre a sua obra e suas motivações para escrevê-la.
Entrevista com Ricardo Oliveira autor
do livro
Verde Gás
TAB UFPB: Como
a cultura da Paraíba influenciou
na sua obra literária? Há elementos culturais específicos que você escolheu destacar?
Ricardo: “ ‘Verde Gás’ eu comecei a escrever em 2018 e a razão foi a mistura de dois fatores: primeiro a vontade de escrever alguma coisa sobre ficção, sobre a realidade política brasileira, no contexto de tudo que estava começando a surgir em 2016 e o estalo para o roteiro e ambientação foi uma realidade específica de João Pessoa. Andando pela cidade, como é uma cidade histórica, no meio de muita modernidade, você encontra prédios antigos, abandonados ou que nunca foram restaurados, com cara de apocalipse”.
“Eu gosto muito de narrativas pós apocalípticas, de histórias de fim de mundo, no cinema, na literatura, e associei as duas coisas e pensei nesse cenário em João Pessoa”. “Lendo o livro você vai acabar vendo bairros, ruas específicas, lugares que remetem a coisas que a gente conhece de verdade na cidade, apesar de tudo ser uma ficção”.
“Talvez a gente ainda esteja muito preso a um certo tipo de representação do que é uma narrativa ficcional, que se passa em cidades do Nordeste. Por muito tempo no século 20 se retratou um Nordeste nesse aspecto de seca, de Zona Rural, de Sertão, ... no fim das contas eu escrevi querendo ler alguma coisa que leio pouco, que é uma história que se passa no centro urbano nordestino e que fosse distópica e de ficção científica, e não apenas realística”.
TAB UFPB: Que aspectos e temas políticos são abordados no seu livro?
Ricardo: "No meu caso, especificamente na minha história, foi muito mais o recorte do Brasil em João Pessoa. Eu não tratei especificamente de realidades políticas que eu acho que só são de João Pessoa, a contextualização de cenário, de comportamentos, de jeito de falar é bem pessoense. Quando vocês tiverem acesso ao livro, vão ver como os diálogos se caracterizam. Uma festa, como se fala de um determinado lugar, essas coisas são bem de João Pessoa.
Mas a política, eu escolhi João Pessoa como uma representação do que aconteceu no Brasil nos últimos cinco, seis anos. Essa política que começou a se descobrir desencantada com um certo tipo de governabilidade no Brasil e que por conta disso começou a aceitar que uma boa solução seria mais à direita, mais conservadora, e mais no sentido relacionado, uma ligação muito forte entre religião e política".
TAB UFPB: Em um comentário do seu livro "Verde Gás" você afirma que é muito importante ter cenários da nossa realidade como paraibanos para que possamos nos conectar, você acha que fazendo isso pode despertar mais o interesse de quem mora nas cidades, mas não lê com frequência?
Ricardo: Eu cresci vendo “O Auto da Compadecida” passar pela primeira vez na televisão, depois se tornar filme, e quando eu descobri que a casa onde a maioria das coisas acontece, é a casa onde eu fui para uma colônia de férias na minha infância, que é a casa da Fazenda Boi Só, isso muda a sua cabeça, porque você começa a se sentir valorizado de alguma forma”.
Imagens: arquiteturaeviver.blogspot.com
“A gente não tem muitas vezes noção de quanto isso é importante para se sentir representado, o se sentir representado muitas vezes não precisa nem mesmo que você diga: Eu me sinto representado!
Não precisa verbalizar isso, só a identificação inicial já é muito importante”.
“A gente está muito preso a um tipo
de representação que é uma narrativa ficcional que se passa nas cidades
do nordeste no aspecto
de seca e pobreza”
Ricardo Oliveira
TAB UFPB: Como foi a experiência cultural e antropológica que você viveu “fantasiado de cosplay do protagonista do seu próprio livro” ?
Ricardo: “Foi muito legal! Foi uma das experiências mais difíceis de arrumar coragem para fazer!”.
“A literatura em geral, não apenas a paraibana, sofre muito com a falta de incentivo financeiro, dificilmente você vive de literatura no Brasil, vender livros e viver disso é praticamente impossível, por essas questões é muito difícil para quem escreve um livro ter tempo de pensar em estratégias de marketing e executá-las por conta própria”.
“Não me faltam ideias para fazer essas maluquices!” “Eu pensei que, se eu colocasse a máscara que o personagem usa, eu iria me sentir mais à vontade, e foi o que aconteceu. Eu estava em um evento como impressa, e conhecia várias pessoas que trabalhavam no evento, desde expositores a pessoas da organização, e eu passei pela maiorias delas e a maioria delas demorava a entender que era eu.
A máscara ajudou a me sentir mais protegido, menos envergonhado e ao mesmo tempo isso foi extremamente importante para campanha da obra, eu estava fazendo uma campanha de financiamento coletivo, que precisava chamar atenção, ter destaque e esse foi o vídeo que teve mais visibilidade da campanha, justamente o vídeo que eu tomei a decisão de fazer a coisa mais arriscada”.
Ricardo: "Eu tenho desde da adolescência um apego muito grande por história, só que nos últimos anos eu intensifiquei muito essa relação de querer me aprofundar em alguns temas específicos...
Aí quando eu comecei a pensar: tanto tempo faço e vou continuar fazendo o texto jornalístico, que teoricamente tem que representar essa realidade de forma objetiva, e a subjetividade no máximo a gente deixa para linguagem, mas ainda se espera que você esteja fazendo um retrato da realidade, pensei: na ficção eu acho que poderia retratar algumas coisas que eu vi, ouvi e senti, não necessariamente com precisão histórica, mas transmitindo os sentimentos que eu acho que não teria uma matéria jornalística"
TAB UFPB: Você acha que pode está resgatando uma vontade dos jovens em ler, trabalhando aspectos geek, cultura nerd ?
Ricardo: “Eu queria que fosse uma história massa, que as pessoas curtissem, que os jovens gostassem de ler e que eles se identificassem.
Na soma desses fatores, um personagem que está andando pela cidade, de Intermares até o Altiplano, do Renascer ao Roger, que anda pela cidade de diferente formas e que ao mesmo tempo remeta a essas ficções que eles já estão acostumados”.
TAB UFPB: Você acha que literatura Nordestina tem espaço no cenário nacional?
Ricardo: “Acho, acho muito! Eu sou prova viva disso, porque estou em uma editora que é de Novo Hamburgo (RS). Não sou o primeiro Paraibano, nem o primeiro nordestino que essa editora escolhe. Não é a primeira editora a fazer isso, pelo menos entre as editoras independentes, que é onde está acontecendo essa novidade”.
“Nas editoras independentes está surgindo de forma mais intencional, a gente quer especificamente abrir mais espaço para autores nordestinos que escrevam bem, que tenham boas histórias para contar”.
“A literatura está em um momento muito novo em que os influenciadores nordestinos tem um papel fundamental”.
“Espero que quando uma pessoa passe pelas prateleiras e veja que a história se passa em João Pessoa, que isso faça a diferença”
Ricardo Oliveira
GASTRONOMIA
Na Paraíba tem sabores de todos os cantos, para todos os buchos
Reportagem:
Débora Luz e Mavi Oliveira
Em parceria com
A gastronomia nordestina nasceu antes mesmo do Brasil. Com suas raízes mergulhadas nos temperos indígenas, africanos e portugueses, a culinária regional tem gosto de mestiçagem e, em cada estado do País, a forma aculturativa apura o próprio sabor, ao produzir pratos tão diversos quanto primorosos.
Do sertão ao litoral, a gastronomia nordestina estimula os sentidos e agrada ao paladar de quem a experimenta. Na Paraíba, por exemplo, há uma enorme variedade com opções para todos os gostos.
Fotos - Alysson Souza
A gastronomia nordestina nasceu antes mesmo do Brasil. Com suas raízes mergulhadas nos temperos indígenas, africanos e portugueses, a culinária regional tem gosto de mestiçagem e, em cada estado do País, a forma aculturativa apura o próprio sabor, ao produzir pratos tão diversos quanto primorosos.
Do sertão ao litoral, a gastronomia nordestina estimula os sentidos e agrada ao paladar de quem a experimenta. Na Paraíba, por exemplo, há uma enorme variedade com opções para todos os gostos.
Especialmente na região do sertão e do semiárido paraibano, os múltiplos ingredientes, temperos, condimentos e especiarias são utilizados no preparo da galinha de capoeira, carne de sol, carne de bode e queijo coalho.
Na capital, João Pessoa, cidade que já se projeta como polo gastronômico do Nordeste, a culinária regional surpreende com a sua explosão de cores, aromas e sabores de pratos servidos em muitos estabelecimentos, como o restaurante Tonho de Martinha, localizado no bairro de Mangabeira, um original e marcante exemplo de gastronomia plural e popular. A marca foi criada em 2021, inicialmente como delivery e, em seguida, conquistando dois pontos físicos - um no Bairro dos Estados e outro no Shopping Tambiá.
De acordo com Stenio Diro, idealizador do empreendimento, em entrevista cedida ao TAB UFPB, o objetivo do Tonho de Martinha foi: “Criar um sabor único. Não precisa ser o melhor, nem o mais gostoso, mas precisa ser o sabor que tem aqui”. Proposta que restaurante cumpre com maestria, mediante sua originalidade e diferenciais.
Seu cardápio conta com pratos tradicionalmente nordestinos, mas com uma roupagem nova, renomeados e incrementados com condimentos do mundo inteiro. “A gente utiliza uma mistura com ingredientes paraibanos, temperos indianos e o modo de preparo árabe”, afirma Stênio. Os sabores do local, então com base na culinária brasileira e nordestina, porém com pluralidade de misturas, originam os sabores únicos do Tonho de Martinha.
Esse combinado de temperos que há nos pratos do restaurante une páprica doce, páprica picante, fumaça em pó, lemon pepper, cominho, pimenta do reino, açafrão, manjerona, alecrim, coentro… e por aí vai! Uma variedade de condimentos que se unem em pratos com nomes originais: o rubacão, comum nas casas nordestinas, transforma-se em “rubatonho”. O fettuccine alfredo, célebre e tradicional prato italiano, recebe elementos nordestinos, como o queijo coalho, o queijo de manteiga e a goma de tapioca no seu preparo, e se apresenta como “Fei é Tu e Teu Tio Alfredo”.
E não é só na criação dos pratos que a marca dá um show de criatividade, mas também em sua própria concepção, em uma odisseia que envolve paixão e comida, que fizeram nascer Tonho de Martinha: “Tem a história por trás deles, é que Tonho deu a volta ao mundo procurando uma pessoa mais bonita que Martinha e não achou, e nessa volta ao mundo ele provou todos os temperos” conta Stênio. Os personagens, Tonho e Martinha são representados pela figura de dois fantoches, que ocupam as redes sociais da marca esbanjando humor e linguajares de afeto com os consumidores, assim como dois avós fariam com seus netos.
Nessa mistura de originalidade e criatividade, há espaço também para o que Stenio aponta como o principal diferencial da marca (além do seu sabor único): o preço. Na capital paraibana, a média do valor de uma refeição é de R$25,00, mas no Tonho da Martinha todos os preços estão abaixo desse valor, mediante sua proposta de ser uma casa com apelo bastante popular, conforme a sua característica e objetivo: É uma revolução comunista para encher o bucho de todo mundo. Ele é. Foi criado pra isso. A missão da gente é encher buchos e bolsos, para encher mais buchos ainda”.
O Tonho de Martinha é um dos exemplos de como a riqueza da culinária paraibana se revela como um rico mosaico de fusões gastronômicas. O resultado é a celebração da herança da culinária paraibana, enriquecida por influências de todas as partes do mundo no céu da nossa boca.
Da galinha de cabidela ao arroz vermelho, do arroz de graxa ao rubacão, encontramos um universo inexplorado de sabores à nossa espera. Cada prato é uma oportunidade de descobrir novas formas de apreciar a cozinha do lugar. O rubacão, por exemplo, revela-se em múltiplas variações, todas com o potencial de encantar os paladares mais exigentes.
FESTIVIDADES
Alavantu ao São João do povo
Reportagem:
Candy Ferraz e Thaynnara Kirlianne
Em parceria com
Uma grande, típica e histórica festividade nordestina é o São João. Conhecida por parte do Brasil como simplesmente festa junina, no Nordeste o São João celebra a tríade sagrada: São João, São Pedro e também Santo Antônio, e carrega uma importância cultural e econômica para todos os estados da região, com direito a forró, quadrilhas, comidas típicas de milho e diversas manifestações artísticas. Na Paraíba, em Campina Grande, a 120 km da capital João Pessoa, acontece o famoso Maior São João do Mundo, que desde 1983, há exatos 40 anos, entrega uma festa rica em cores, personagens, atrações artísticas e múltiplas vivências lúdicas, em exaltação ao jargão "30 dias de festa", desde a sua segunda edição. Sim: são trinta dias seguidos celebrando a época mais aguardada por muitos paraibanos, que em Campina Grande acontece no Parque do Povo, área central da cidade com capacidade para receber 57.278 pessoas, de acordo com o Corpo de Bombeiros da Paraíba, e se distribui ao redor da famosa Pirâmide do Parque do Povo, um espaço criado para que as danças fossem contempladas como centro da festividade.
Nela, famílias, casais, crianças e adultos demonstram o melhor do arrasta-pé. Por todo o resto da imensidão do local, o ambiente é composto pelos pavilhões com barracas de bares e restaurantes, shows pirotécnicos marcantes, fogueira artificial do Parque do Povo – ponto de encontro para muitos – e o palco principal com sua chamativa programação que reúne os mais diferentes gêneros musicais, inclusive aqueles sem identificação com a cultura junino-nordestina.
Ressaltar o forró e a música popular nordestina sempre foi uma premissa dessa festividade, como num pacto entre quem a faz e quem a contempla. No entanto, como cantava Luiz Gonzaga, "Tinha mais animação / Mais amor mais emoção / Eu não sei se eu mudei / Ou mudou o São João", há um grande questionamento sobre a preservação da memória cultural de uma festa que é também a identidade de um povo, e que agora ganha um caráter político-publicitário, dando espaço a camarotes com visão privilegiada e a outros ritmos em detrimento do forró local. Em 2023, em meio à edição que marcava os 40 anos do São João de Campina Grande, uma grande discussão tomou conta das redes sociais em todo o país, chegando inclusive aos assuntos mais comentados da rede X, antigo Twitter, e ganhando repercussão nacional em diversos veículos de comunicação. A queixa era unânime sobre a falta de respeito de tirarem do palco mais cedo o cantor Flávio José, sanfoneiro paraibano com célebre e longeva carreira, além de legião de fãs desde os anos de 1980, para que Gusttavo Lima, um dos maiores nomes do sertanejo atual, pudesse fazer a sua apresentação.
O próprio cantor deu seu depoimento sobre como se sentiu acerca do ocorrido, e ganhou o apoio de outros cantores populares, como Santanna.
Outro aspecto muito comentado nessa mesma edição diz respeito ao fato de o "Parque do Povo" não ser mais tão do povo assim, e sobre o fluxo de segregação que vem sendo reforçado edição após edição. No perfil do Levante Paraíba, movimento organizado por jovens que estão à frente de pautas sociais, um post questionando o título de "Maior São João do Mundo" ganhou mais de 1.500 curtidas. Nele, a luta dos trabalhadores ambulantes que fazem suas vendas ao redor do Parque do Povo era apresentada, e a denúncia de privatização do local de trabalho veio junto a um vídeo publicado.
Na verdade, a total privatização do Parque do Povo ocorre desde o ano de 2017, ato que eiva de suspeições os discursos políticos de que “todos ganham com a festa”, afirmação histórica e consensual relativa à grande festa campinense que passou a ser complementada com a ideia de que “uns ganham muito mais que os outros”. Já que o evento passou a sem altamente rentável para àqueles que mantém nebulosas relações com a administração municipal. Nas festas, portanto, como tudo o mais que acontece na vida em sociedade é campo de desigualdades e disputas, sempre há vencedores e vencidos, e se expõem as mesmas mazelas das diretrizes capitalistas.
Todavia, em termos de resistência, ao menos do campo do simbólico, detalhe muito válido para projetar o Maior São João do Mundo para todo o país, graças à enorme cobertura midiática é o povo é quem literalmente faz a festa, saboreando-a ao seu modo, vivenciando suas ofertas lúdicas, intensa e entusiasticamente, considerando-se, em especial, que as celebrações envolvem questões de pertencimento identitário, um conjunto de comportamentos que, mesmo aleatório, paradoxalmente, acaba contribuindo (e justificando) com a obscura associação do segmento político-administrativo com o comercial.
Uma coisa é certa: uma festa com títulos tão importantes e datada no calendário nacional merece revisitar a sua proposta e, sobretudo, ouvir o seu público. Afinal, para que continue sendo grande e do povo, é preciso que o Maior São João do Mundo convide todo mundo a dançar e se deliciar. Alavantu (à frente), mas também anarriê (voltar) se o São João não for do Povo.
Fale com o TAB UFPB
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Publicado em 24 de abril de 2024
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